A natureza inclusiva do ministério
de Jesus foi extremamente confrontadora para os judeus, com sua cultura
religiosa de separação ascética. Era inadmissível para o judeu ortodoxo, em
especial o fariseu, a mera comunicação visual com gentios ou pecadores; seu
elevado padrão de auto-justiça e moralidade, fazia com que estes religiosos
extremistas enojassem aqueles que professavam sua fé e seu estilo de vida.
Surge, então, Jesus de Nazaré, com uma nova proposta de alcance das massas, Ele
não queria fazer prosélitos do judaísmo, nem tão pouco impor novos dogmas ou
leis às pessoas, Ele as convidava para entrar no Reino de Deus, com sua Lei do
Espírito, sua contracultura, e suas promessas vindouras. Mas este não era o
grande problema na perspectiva dos fariseus; o problema era o público alvo de
Jesus: Todo o que crê. Indignado com o critério intolerante do “crivo”
religioso dos judeus, Jesus desabafa:
“E disse o Senhor: A quem, pois,
compararei os homens desta geração, e a quem são semelhantes? São semelhantes
aos meninos que, assentados nas praças, clamam uns aos outros e dizem: Nós
tocamos flauta, e não dançastes; cantamos lamentações, e não chorastes. Porque
veio João batista, que não comia pão nem bebia vinho, e dizeis: Tem demônio.
Veio o Filho do Homem, que come e bebe, e dizeis: Eis aí um homem comilão e
bebedor de vinho, amigo dos publicanos e dos pecadores.”
Lucas 7:31-34
Este foi o apelido que Jesus recebeu,
“Amigo de pecadores”, e este é a realidade, pois até então, os pecadores não
tinham ninguém por si, senão a acusação, rejeição e exclusão social, mas agora,
em Jesus, eles encontram uma nova mentalidade sobre o interesse de Deus por
eles.
Jesus é o Evangelista por excelência,
Ele é, não somente o principal propagador da Boa Nova do Reino de Deus (o
Evangelho), como é também, o autor desta Boa Nova; e Ele mesmo nos deixou um
paradigma absoluto e imutável para o ministério evangelístico com sua
mentalidade e visão inclusiva e contextualizadora.
Inserido em uma cosmovisão judaica
separatista, Davi externou um celebre Salmo que em sua época refletia a vontade
de Deus para o povo de Israel: “Bem aventurado o varão que não anda segundo
o conselho dos ímpios, nem se detém no caminho dos pecadores, nem se assenta na
roda dos escarnecedores.” (Salmo 1:1).
Não desejo em hipótese alguma ferir a
ortodoxia bíblica veterotestamentária, mas considerando a nova proposta de
Jesus de alcance dos desafortunados irreligiosos, não podemos como Igreja de
Deus em Cristo Jesus, praticar a literatura desse texto, senão, apenas o
primeiro conselho davídico para os nossos dias: “não andar segundo o conselho dos
ímpios”. Perceba, porém, que Jesus em seu ministério terreno não foi
guiado pelo conselho de homem algum, mas pelo Espírito Santo, embora,
contrariando o salmo, ele constantemente se detinha no caminho dos pecadores, e
sem constrangimento se assentava na roda dos escarnecedores; a grande diferença
era que Ele não pecava nem escarnecia, mas influenciava. Este é o legado de um
verdadeiro Evangelista e de um cristão com visão apostólica, ao contrário dos
cristãos neófitos ou hipócritas, ele se dá com os não crentes.
Este “dom” evangelístico de
contextualização consiste em pelo menos cinco aspectos a serem desenvolvidos
pelo aspirante a evangelista e pela Igreja biblicamente Apostólica:
(1) Um discernimento da mente dos
não crentes;
(2) Uma linguagem peculiar aos não
crentes;
(3) Uma interação sem medo com os
não crentes;
(4) Uma familiarização num nível
pessoal com os não crentes;
(5) Uma habilidade de compreender e
sanar crises enfrentadas pelos não crentes.
No contexto em que o
apóstolo/evangelista Paulo orientava a Igreja de Corinto acerca do procedimento
disciplinar apropriado para lhe dar com um caso de extrema imoralidade sexual
dentro da igreja, ele chega em certo ponto e escreve:
“Já por carta vos tenho escrito
que não vos associeis com os que se prostituem; isso não quer dizer
absolutamente com os devassos deste mundo, ou com os avarentos, ou com os
roubadores, ou com os idólatras; porque então vos seria necessário sair do
mundo. Mas, agora, escrevi que não vos associeis com aquele que, dizendo-se
irmão, for devasso, ou avarento, ou idólatra, ou maldizente, ou beberrão, ou
roubador; com o tal nem ainda comais.”
I Coríntios 5:9-11
Esta uma das marcas da consciência
evangelística, a dissociação com os falsos irmãos, e a associação com os
descrentes pecadores. O ponto aqui não é comunhão, mas sim influência. Jesus
comparou o Reino de Deus com o fermento (Mateus 13:33), e uma das
características do fermento é que não é a massa que influencia e altera o
fermento, mas o fermento influencia e altera a massa, e na concepção apostólica
tanto de Jesus Cristo, quanto de Paulo, o fermento ruim não é o incrédulo pecador,
mas sim o pseudo-religioso e o crente profano (Mateus 16:6, 12; I Coríntios
5:6-7).
A mentalidade evangelística legalista
de muitas igrejas de nosso século, não se parecem em nada com o método
apostólico de evangelização. Não acredito que Jesus ficou incomodado ou
perturbado com o fato de um de seus mais influentes apóstolos ter caminhado
três anos e meio com Ele sem renunciar a espada que estava em sua cintura,
Jesus se fazia de desentendido com a situação, pois sabia que a ação do
Espírito Santo no advento de Pentecostes o transformaria. Não adiantaria tirar
a espada da cinta e não tirá-la do coração; não adianta vivermos regidos por
códigos religiosos de leis: “pode isso, e não pode aquilo”, isso não é
transformação, é mera religião (Colossenses 2:20-23). Não ganhamos almas para
Cristo, para sobrecarregá-las com nossas ordenanças dogmáticas denominacionais;
não podemos tentar usurpar o papel regenerador do Espírito.
Parece-nos que Paulo possuía uma
abordagem contemporânea do evangelho, repleto da doutrina de Cristo oculta em
linguagem greco-romana (vigente na época), porém, desvinculada dos elementos
ritualistas da fé judaica. E nós, como uma geração apostólica, precisamos
desenvolver uma “nova” linguagem missiológica; em outras palavras, precisamos
renunciar nosso “evangeliquês igrejeiro”, encontrando o equilíbrio de uma fala
sã e irrepreensível, e ao mesmo tempo moderna e culturalmente contextualizada.
Da mesma forma, Paulo também se utilizava de uma metodologia transcultural
arrojada, que perturbou o senso de sagrado e profano dos religiosos de seu
tempo, e certamente teria causado a mesma perturbação em igrejas retrógradas em
nossos dias. Em poucas de suas palavras podemos compreender a visão
evangelística e missionária de Paulo:
“Porque, sendo livre para com
todos, fiz-me servo de todos, para ganhar ainda mais. E fiz-me como judeu para
os judeus, para ganhar os judeus; para os que estão debaixo da lei, como se
estivera debaixo da lei, para ganhar os que estão debaixo da lei. Para os eu
estão sem lei, como se estivera sem lei (não estando sem lei para com Deus, mas
debaixo da lei de Cristo), para ganhar os que estão sem lei. Fiz-me como fraco
para os fracos, para ganhar os fracos. Fiz-me tudo para todos, para, por todos
os meios, chegar a salvar alguns”
I Coríntios 9:19-22
Nas palavras do versículo 22 Paulo
revela a abrangência de sua estratégia: “...para, por todos os meios, chegar a salvar
alguns.”
A rejeição e a perseguição nem sempre
é reflexo de uma igreja santa e separada; na verdade, no modelo apostólico de
avivamento em Atos, a igreja estava “...caindo na graça de todo o povo. E todos
os dias acrescentava o Senhor à igreja aqueles que se haviam de salvar.”
Muitas vezes, o motivo real da igreja moderna ser rejeitada e pisada pelos
homens, é que ela é um “sal imprestável” que perdeu o sabor e não tempera. “Vós
sois o sal da terra; e, se o sal for insípido, com que se há de salgar? Para
nada mais presta, senão para se lançar fora e ser pisado pelos homens.”
(Mateus 5:13).
A Igreja é comparada por Jesus a uma
poderosa cidade, geograficamente edificada sobre um monte; também é comparada a
uma luminosa lâmpada acesa, colocada em evidência num velador de uma casa
escura, assim, Jesus exorta a que não nos escondamos ou nos alienemos deste
mundo como, pois a luz só é luz brilhante em contato com as trevas (Mateus
5:14-15). Em sua oração sacerdotal Jesus rogou ao Pai, a que não nos tirasse do
mundo, mas que nos livrasse do mal (João 17:15-18).
Um cristão apostólico, e especialmente
um genuíno evangelista, não pode resplandecer a sua luz no contexto interno da
Igreja, ao contrário, como disse o Senhor: “Assim resplandeça a vossa luz
diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem o vosso
Pai, que está nos céus.” (Mateus 5:16).
Acredito que a atitude evangelística
mais arrojada e confrontadora de Jesus foi sua entrada na residência do chefe
dos corruptos cobradores de impostos da época, Levi. Somente para que
entendamos o caráter radical da rejeição desses chamados publicanos por parte
dos judeus, eles eram também judeus, porém, trabalhavam colhendo de seus
patrícios, impostos abusivos para o governo romano, além disso, eram homens
profanos e destituídos dos valores morais oriundos da Lei de Moisés. Assim,
houve a exigência de uma irrevogável separação de todo judeu ortodoxo desses
pecadores inveterados. A narrativa bíblica não somente nos diz que o Mestre não
somente viu Levi na coletoria e o chamou, mas também, entrou em sua casa. Isto
era inadmissível, uma atitude das mais profanas e contaminadoras que um judeu
poderia tomar, especialmente em se tratando de um rabino tão aclamado na época
como Jesus. Certamente, até mesmo seus discípulos o censuraram secretamente. E
respondendo a indagação legalista dos escribas da lei e dos fariseus, Jesus
declara: “...Os são não necessitam de médico, mas sim os que estão doentes; eu
não vim chamar os justos, mas sim os pecadores.” (Marcos 2:17).
Precisamos parar de oferecer
“quimioterapia para os resfriados da igreja”; a verdadeira praga está assolando
o mundo à nossa volta, e ela se chama PECADO. Vamos às casas e mesas dos
doentes pecadores e levemos o único remédio que os pode curar de fato, a Vida
Eterna, por Cristo Jesus, nosso Senhor (Romanos 6:23).
Voltemos a citar Paulo de Tarso, pois
nenhum outro ministro compreendeu essa natureza abrangente da influência do
evangelho quanto ele. Considerando a mentalidade de Jesus Cristo (I Coríntios
2:16), Paulo escreve: “E, se algum dos infiéis vos convidar e
quiserdes ir, comei de tudo o que se puser diante de vós, sem nada perguntar,
por causa da consciência. Mas, se alguém vos disser: Isto foi sacrificado aos
ídolos, não comais, por causa daquele que vos advertiu e por causa da
consciência; porque do Senhor é a terra e toda a sua plenitude.” (I
Coríntios 10:27-28).
Este deveria ser o apelido de cada
evangelista e de cada crente cheio do Espírito Santo e com a mente de Cristo:
“AMIGO DE PECADORES”
Deus em Cristo o abençoe.